Numa época em que, ser-se Aficionado, é um desprimor, impróprio dos cidadãos civilizados, registamos e recordamos acontecimentos que narram a história da Tauromaquia. Narrativas trágicas, singulares, curiosidades e homenagens, recordações de momentos marcantes da “Festa do Toiro”… um blog para Aficionados!
Alguns não compreendem como a “Festa dos Toiros” pode hoje (ainda e sempre), emocionar, comover, exaltar multidões. Aos olhos de alguns intelectuais snobes e reaccionários incultos, o toiro é uma vítima e o toureiro martiriza a besta. A minha visão compreende o toiro como um animal combatente, e o toureiro como um herói contemporâneo, que tem a audácia de desafiar e enfrentar uma fera, arriscando a vida – sem mais, pela beleza do gesto, por pura liberdade, para afirmar o seu próprio desapego em relação às vicissitudes da sua própria existência e a sua vitória sobre o imprevisível. É certo que o toiro não quer combater, mas não porque seja contrário à sua natureza o combate, mas sim porque é contrário à sua natureza o querer.
Madrid, 4 de Outubro de 2003, segunda Corrida da Feira de Outono. A tragédia sobrevoou Las Ventas quando um enorme touro de El Pilar, de nome “Portiguero”, saltou a trincheira, junto ao burladero de quadrilhas. O callejón transformou-se numa catarata de homens que se precipitavam para a arena. Alfonso Romero, Moço de Espadas de Salvador Vega, reagiu tarde e quando quis alcançar a trincheira já era tarde: o touro alcançou-lhe, pelo tornozelo, destroçando-lhe o pé.
Parte Médico de Alfonso Romero: “Fractura abierta de grado 3 en el tércio inferior de la perna derecha, de prognóstico grave” Segundo o Doutor Máximo Garcia, a colhida foi tão forte que existe o risco de perder o pé, uma vez que a fractura é muito grande.
8 de Abril de 1997, a tragédia rondou a Real Maestranza de Sevilha. Jesús Franco Cardeño resultou colhido, de máxima grávida, ao receber o primeiro touro da tarde, em sorte à “porta da gaiola”. O touro meteu-lhe o pitón na boca e desgarrou, literalmente, a parte direita da cara. A imagem, horrorosa, permanecerá gravada na mente dos presentes. Um milagre salvou-lhe a vida. Era a oportunidade à muito esperada, que Franco Cardeño não queria desperdiçar…por pouco, não lhe custou a vida.
Naquela tarde de 8 de Abril de 1997, saía o primeiro touro da tarde, de nome “Hocicón”, da Ganadaria de Prieto de la Cal, com 545 Kg de peso, que arrancou metade da cara a Franco Cardeño. Meteu-lhe o pitón na boca e, como se virasse a página de um livro, arrancou-lhe a metade direita do rosto. Levou-lhe por diante e deixou-o, inerte, horroroso, uma massa disforme coberta de sangue. Jesús Franco Cardeño abre praça. Soam os clarins. “Hocicón” espera nos curros. Cardeño, passo firme e decidido, cruza a arena da Maestranza, em direcção à porta dos chiqueros. Era uma actuação de vida ou morte, uma oportunidade à muito ansiada. Segundos angustiosos, com a quadrilha nos burladeros adjacentes. Sai “Hocicón”, Cardeño hesita e cita-o para o lado esquerdo. O touro, negro bragado e de córnea bem armada, investe no vulto, colhendo o toureiro. Capote pelos ares, uma voltareta tremenda. Franco Cardeño cai, ficando inerte, com a cara na arena, como morto. São segundos angustiantes, em que as quadrilhas correm a acudir o “maestro”. O touro vira-se e passa por cima do toureiro, que nem se move. Como podem, sacam o touro. Cardeño permanece no solo, não se move. Quando as quadrilhas o levantam, em braços, a cena é dramática: a cara ensanguentada, bocados de carne pendentes, o sangue envolvendo tudo. São momentos de incerteza enquanto o toureiro é retirado da arena e levado pelo callejón. À sua passagem, provoca o espanto e o pânico entre os presentes, que escondem a cara, não querendo olhar, não querendo saber o que se passava.
Parte Médico:"Herida en scalp en mejilla derecha que desde el mentón llega al orbitario, dejando al descubierto músculos angular y caninos, rompiendo el conducto de Stenon con desgarro de párpado inferior. Rotura de la arterias angular y de las musculares y perforación de la fosa nasal derecha. Se procedió a anestesia con intubación, realizando hemostasia de vasos arteriales. En la revisión de la herida, se encuentra una fractura por arrancamiento del malar derecho y probable fractura del maxilar inferior. Dado que tuvo pérdida de conocimiento en el ruedo fue precisa la exploración por scanner. Se le traslada al hospital Virgen del Rocío, donde necesitará atención multiespecializada por oftalmólogo, otorrino, neurocirujano y cirujanos maxilo-facial y plástico".